Domenico Fioravanti

O político, para ele, é aquele que sabe olhar longe, que sabe “sonhar” e que sabe depois trabalhar para dar forma a estes sonhos.

(contado por sua filha Clara)

Domenico Fioravanti nasceu em Camerata Nuova em 13 de Junho de 1938. Ele era um Marechal da Guarda de Finança e um militante político apaixonado da cidade de  Trento.


Relatamos a seguir o que sua filha Clara disse a um grupo de parlamentares italianos para apresentá-lo.

“Meu pai viveu seu compromisso político como cidadão, como militante apaixonado em um partido, como funcionário público na Guarda de Finança e como representante dos pais nos órgãos representativos da minha escola e das minhas irmãs.

Ele partiu para o paraíso há dois meses, em 14 de setembro (2007). Vivíamos juntos a frase do Evangelho que diz: “Portai-vos como cidadãos dignos do Evangelho”. Recordando a vida de meu pai, eu percebo que ele encarnou realmente estas Palavra do Evangelho.

Desde criança começou a se interessar pela política, sempre tentando entender, chegar ao fundo das coisas. Nascido em uma família pobre, ele sentia que a política tinha que se preocupar antes de tudo com os últimos, com aqueles que não têm privilégios, e que lutam para viver uma vida digna. Assim, ele havia feito sua escolha de campo, colocando-se ao lado daqueles que pareciam ter preferência genuína com os últimos, e não apenas com interesse demagógico.

Posteriormente, alistou-se à Guarda de Finança, e mesmo naquele mundo, muitas vezes sendo difícil, conseguia comportar-se como um “cidadão digno do Evangelho”. Desempenhou seu trabalho com grande respeito pela lei, mas também por aqueles que tinha em frente, nunca desistindo dos serviços difíceis ou perigosos.

Me lembro de um episódio que ficou marcado na minha mente; era pequena, tinha 5 anos, e meu pai recebeu em casa uma embalagem de natal de uma empresa. Não me lembro o que continha, mas me lembro bem do meu entusiasmo infantil em ter diante de mim belos presentes que tinham sido enviados a nós. Sabia que os presentes eram um sinal de grande estima, de afeto, por isso fiquei encantada quando escutei o meu pai dizer a minha mãe: “ Mande-os de volta”. Meu pai depois me explicou que naquelas embalagens continham presentes “muito grandes” que não eram sinal de estima, mas sim uma tentativa de suborná-lo. Este era o meu pai: rigoroso e inflexível (…): Muitos diretores de empresas,  maravilhados com a sua calma, com a sua cortesia, com o respeito que demonstrava a eles, perguntaram-lhe, uma vez que terminava as investigações, porque ele não se aproveitava da situação para obter um preço especial ou a mercadoria de presente…

O seu respeito era com todos, também aqueles que tinham infringido a lei. Isso era uma qualidade muito forte nele: Mesmo quando devia revistar uma casa, ou quando tinha que prender alguém, ele ainda tentava fazer isso com respeito. Repreendia os colegas que desarrumavam armários e gavetas, que usava algemas de maneira rude com os suspeitos, assustando-os e também as suas famílias.

O mesmo respeito caracterizava o seu agir em relação aos seus superiores, dos quais exigia porém coerência e transparência:  uma vez recebeu um telefonema com uma ordem que não condizia, e se recusou a cumpri-la até que chegasse por escrito. A ordem nunca chegou e ele não a realizou. Ao passar poucos dias porém, chegou a ele uma ordem de transferência.

Naquele período – acredito que era metade dos anos 80 – meu pai trabalhava na seção hidrocarbonetos, na qual era especialista, tendo participado também de uma investigação relacionada ao escândalo dos petróleos. Dali foi enviado para seção de averiguação, com novos colegas e novas funções: chegava como Marechal, mas deveria aprender tudo com o sargento mais  jovem. Ele soube se adaptar à situação sem drama, com compromisso e humildade.

Anos depois, ele nos contava esse episódio, principalmente quando as situações da vida, nos colocavam diante de derrotas aparentemente sem sentido: ele se adaptou a ter que aprender desde o “abc” as investigações,  sem parar na decepção da injustiça, e tudo isso foi de grande ajuda anos mais tarde, quando foi transferido de Trento para Roma, continuando a trabalhar no mesmo campo profissional, no qual já tinha se tornando um especialista.

Este seu modo de agir, naturalmente, também o colocou em perigo: uma vez durante um serviço particularmente delicado, recebeu ameaças. Em particular, estas pessoas o fizeram entender que eles poderiam fazer mal a nós, as três filhas. A família era tudo para meu pai; entretanto, continuou o seu trabalho. Nunca nos disse nada, limitava-se a recomendar  a nossa mãe, que não permitisse que nós saíssemos sozinhas “porque tinha muitos carros pelas ruas”.

A mesma “pureza de coração” meu pai buscava na política, da qual tinha um conceito muito alto: o político, para ele, era alguém que sabe olhar longe, sabe “sonhar” e que sabe depois trabalhar para dar forma a estes sonhos. Para ser um político não basta, segundo ele, limitar-se ao hoje, ao trabalho burocrático, não, precisa olhar para frente e fazer grandes projetos. Meu pai seguia com paixão a vida política nacional e mundial, sabia ler os sinais dos tempos e buscava sobre cena política alguém que tivesse estas características de ser visionário e – diria ainda – de sapiência.

A política local o atraia um pouco menos; mesmo assim sentiu o dever de trabalhar também alí, porque a intuição, o saber “olhar em frente” podem caracterizar todas as realidades, grandes ou pequenas. Daqui nasceu o seu trabalho na seção distrital e cidadã do seu partido, na qual era uma voz mediadora, atenciosa, crítica, mas também propositiva e rica de bom senso. O ideal da fraternidade, que o fascinou,  o incentivou a buscar o diálogo com todos: membros de seu partido e membros de outros partidos, embora permanecendo, como ele dizia, “muito colorido”.

Suas ideias permanecem enraizadas, mas antes delas, colocava seus interlocutores, e o diálogo com eles. Não parava para atacar pessoalmente os adversários políticos, preferia discutir as ideias, talvez esquentando um pouco o diálogo, mas nunca atacando a pessoa.

Meu pai era um homem político que ia pelas ruas, comprimentava o prefeito com a mesma alegria com que comprimentava o gari da praça onde estacionava: Este senhor, depois comprimentava a nós meninas dizendo que meu pai era um “de alto nível”, um político e uma vez o pediu ajuda para conseguir uma promoção. Uma outra vez,  algumas senhoras de idade, que o encontravam na missa, pediu ao meu pai para que ele assinasse uma petição para a prefeitura:  meu pai não assinou, porque não estava de acordo com aqueles argumentos, mesmo assim, alguns dias depois, levou a elas copias com a deliberação da prefeitura e artigos de jornais para motivar a sua escolha: Porque ele sempre buscava a verdade, e queria que todos buscassem-a, e que pudessem realmente avaliar os fatos como eram, sobre uma luz verdadeira.

Agora que meu pai está no paraíso, sentimos uma forte vontade de levar a frente a sua herança, feita de amor pela verdade, coerência e de uma vida marcada ao ideal da fraternidade/unidade. No meu trabalho sinto cada vez mais forte a exigência de não me contentar com soluções cômodas, ou de fechar os olhos diante dos problemas e – se não posso fazer nada – busco ao menos de fazerem escutar a minha voz, mantendo porém respeito aos meus superiores e colegas. Não é um caminho fácil, também leva às derrotas (segundo a lógica humana), porém estamos certas que é esse o caminho que o nosso pai nos indicava para nos tornar também “cidadãs dignas do Evangelho”.