Empatia e diálogo para superar a polarização

Politica | O amor dos amores

Francisco Borba Ribeiro Neto*

* Coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC/SP

Font: Cidade Nova | Janeiro/Fevereiro 2023 – Campanha da Fraternidade

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     PÓS-ELEIÇÕES Neste artigo de estreia desta seção, o autor propõe posturas e gestos simples e concretos que podem ajudar a todos a dar passos que nos ajudem a encarar o tema da política – essencial para a cidadania de todos – com sobriedade.

O resultado do segundo turno de nossa eleição para presidente de 2022, com uma diferença mínima de votos entre os candidatos, mostrou uma sociedade dividida, onde nenhum lado pode se apresentar como representante da maioria, portador da vontade popular. Infelizmente, esse dado, ao invés de gerar um diálogo humilde, onde cada um procura o outro, tem gerado uma rejeição escandalizada entre ambas as partes, que parecem não aceitar nem a racionalidade, nem a boa intenção do outro.

Contudo, sem um mínimo de consenso em torno a certos pontos, a construção de um país torna-se um processo errático e ineficiente. É sempre necessário um consenso que respeita claramente as minorias, ao mesmo tempo que traça limites claros tanto para os Poderes institucionais quanto para as forças sociais, de modo que todos saibam o que é desejável ou possível, o que não é desejado e até condenável – seja na vida econômica, nas pautas de costumes ou na esfera política propriamente dita.

A polarização extremada dos últimos tempos deixou, com certeza, marcas profundas em nossa sociedade – mas não estamos “condenados” a essa dinâmica. A superação interior das mágoas e dos extremismos depende da construção de uma “política melhor” e da recuperação de um tecido social esgarçado. Tarefas que pertencem não só aos políticos, mas a todos os cidadãos.

A tarefa que nos cabe

Se procurarmos, entre nossos opositores, pessoas más, que só pensam em nos destruir, certamente encontraremos. Se procuramos, entre esses mesmos opositores, amigos, ansiosos por reconciliação, também encontraremos. Nosso relacionamento com o outro é, em grande parte, definido pela forma como nos aproximamos dele. Se nos aproximamos de forma agressiva, encontraremos, quase certamente, agressividade; se nos aproximamos com cordialidade, teremos mais possibilidade de encontrar cordialidade.

Para os cristãos, existe uma razão a mais para buscar a superação das divisões: é no amor mútuo que seremos reconhecidos pelo mundo (cf. Mt 18, 20; Jo 13, 35). Somos chamados a estar juntos, reconhecendo as diferenças e procurando a verdade. Para isso, é necessário ser humilde, amar até o inimigo, ser paciente na tribulação e constante na oração (Ro 12, 3-21).

Quando vemos em nossas comunidades tantas pessoas boas com posições políticas opostas e conflitantes, temos que reconhecer que algumas dificuldades e aspirações não foram compartilhadas, compreendidas e nem mesmo respeitadas. Não podemos imaginar que nosso irmão é “burro” ou “mal intencionado”, temos que tentar compreender o que existe de mais profundo e verdadeiro em seu coração, nos comprometermos também com essas aspirações e necessidades.

Vencedores e vencidos devem tentar melhorar

Uma tendência instintiva no ser humano é o de espezinhar os derrotados. Com isso, o ressentimento se acumula, ganhando a forma de um espírito vingativo, que desrespeita até aos direitos do outro – dificultando cada vez mais a construção de consensos e do bem comum. Para os eleitores do vencedor, é sempre necessário um esforço para evitar a humilhação do adversário, para manter uma postura de acolhimento e um verdadeiro desejo de entendimento e construção conjunta. O vencedor deve procurar entender as razões do perdedor, inclusive assimilando aquilo que existe de verdadeiro na posição do outro e assim melhorando suas próprias propostas.

Quando perdemos, tendemos a nos fechar ou a nos tornarmos violentos, considerando que o outro “não sabe votar”. Nos fechamos e perdemos cada vez mais a capacidade de dialogar e entender o outro. Porém, se nosso candidato perdeu é porque ele não conseguiu se apresentar para a maioria como o candidato melhor (ou o “menos pior”). Temos que superar o vitimismo e o ressentimento, fazendo uma autocrítica severa e construtiva: saber o que não conseguimos comunicar, o que não entendemos, onde nossas propostas estavam objetivamente erradas.

Empatia e diálogo

As palavras do Papa Francisco, dirigidas justamente aos brasileiros, na Jornada Mundial da Juventude de 2013, são particularmente significativas nesse momento: “Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo […] Quando os líderes dos diferentes setores me pedem um conselho, a minha resposta é sempre a mesma: diálogo, diálogo, diálogo. A única maneira para uma pessoa, uma família, uma sociedade crescer, a única maneira para fazer avançar a vida dos povos é a cultura do encontro; uma cultura segundo a qual todos têm algo de bom para dar, e todos podem receber em troca algo de bom”.

Nesse momento, para podermos dialogar, temos que dar um mergulho “empático” para a compreensão do outro: ir até o íntimo tanto das nossas próprias convicções quanto daquelas de nosso interlocutor, procurar entender e explicitar os anseios mais profundos de cada um de nós. À medida que superamos as capas ideológicas, os desejos desordenados, as ilusões enganosas, encontramos aqueles anseios de amor, felicidade, realização e liberdade que são a razão de ser mais profunda de nosso agir no mundo.